terça-feira, 7 de abril de 2009

O livro (parte 6)


O céu está nublado. Rua escura, casas fechadas... Não há ninguém ali além de Jonas sentado no meio fio. Ele se sente só, mas não reclama. Gira seu anel no dedo, tira..., põe de novo..., amarra o cadarço do sapato, enfia as mãos nos bolsos como se procurasse algo. Não há muito o que se fazer na rua da solidão. Ele já nem procura entender mais nada do que aconteceu, está crente de que realmente tivera um sonho. Um sonho absurdo, mas apenas um sonho. E o fato do livro parar em suas mãos daquela forma, ele julga ter sido uma “brincadeirinha” de alguém que na sua ingenuidade sequer imaginava o sonho que ele tivera. Apenas coincidência. Mas por quê ele ainda continua triste se já não acredita que nada daquilo aconteceu? Exatamente por isso, exatamente por pensar que nada aconteceu de verdade. Ele gostaria que tudo fosse real, a doce menina com sua voz calma, sua boca rosada, seus risos...

A chuva anuncia sua chegada em meio a trovões e raios. Jonas continua lá, parado, entregue aos pingos finos que lentamente vão molhando seu corpo e o encharcando. Em poucos minutos a chuva se manifesta por inteira. Jonas então se levanta, segue andando pela rua da solidão e se abriga em um toldo frente a uma casa. Está escuro, mal dá pra notar que existe alguém ali. Encosta no muro e fica lá por um longo tempo. Ele está com frio, seus braços e seus lábios tremem... Encolhe-se num cantinho e fica mais próximo ao portão da casa. Involuntariamente pousa o olhar sobre a grade do portão e vê uma janela aberta no segundo andar da casa. As luzes estão acesas... Ele nota que há um televisor ligado pelas alternâncias de iluminação lá dentro. Vê uma pessoa passar rapidamente... É uma mulher. Pela intensidade da chuva não dá pra ver nitidamente tudo que há por trás da janela de vidro. A mulher novamente passa, dessa vez resolve parar na janela e olhar a chuva. Está com uma toalha na cabeça, vestida apenas com peças íntimas e com uma roupa na mão. Ali deve ser seu quarto. Jonas se recua com receio que ela o veja, afinal ele não está ali para espioná-la, nem admirá-la, embora seja aparentemente bonita. Não dá pra ver seu rosto nem com muito esforço. Jonas não se contém, olha mais uma vez para a janela, os traços que contornam o corpo dela o agradam. Ela fecha a persiana e se recolhe. Jonas resolve ir embora mesmo ainda com a chuva em pingos grossos pois percebe que demorará a passar.

Jonas vai andando pensativo pelas ruas sombrias do bairro. Sorri para si quando se prende ao passado. Julga-se ironicamente “um louco” por confundir um sonho com realidade. Ele se lembra da página com todas aquelas coisas escritas as quais até decorou e repetiu para si por diversas vezes, e que esta por fim, não está de fato no livro. Isso desperta novamente uma curiosidade no homem robusto e questionador. Finalmente chega à sua casa, abre a porta, entra, tira a roupa, vai pro banheiro, toma seu banho, se enxuga, se veste, abre a gaveta do seu criado-mudo, pega o livro e então se deita na cama.

Ele relê algumas páginas, especificamente as que falam dos momentos de mais contato entre o casal. Depois pega a página escrita possivelmente por uma mão feminina, as letras são minúsculas e bem desenhadas. Ele não entende como pode ter um livro que relata um sonho que sequer contou para alguém. A página que está em sua mão é muito semelhante com a que ele presenciou a doce menina escrever no primeiro dia.

- Alguém escreveu isso! Quem terá sido? (Pergunta ele para as paredes de seu quarto). - De quem será este livro? Foi perdido e encontrado por alguém? Ágatha Nouren... Nunca ouvi falar de Ágatha Nouren... Ficarei realmente louco se eu der trela para tudo isso. Mas essa página pertence a alguém e isso não me sai da cabeça. Alguém marcando um encontro com seu namorado ou amigo? Aff, como veio parar em minhas mãos este livro misterioso?

Jonas está cansado. Guarda o livro e se deita com desejo de dormir bem para acordar melhor no dia seguinte. Dá um longo suspiro, o qual confirma seu cansaço físico e também mental.
Faz uma rápida recordação do seu dia aturdido e então lembra do seu refúgio no momento da chuva. E é inevitável não lembrar da casa do quarto iluminado situada na rua da solidão. Então lembra da mulher parada na janela de vidro com suas formas atraentes ao que chama de bom gosto. Boceja e por fim dorme.


(continua...)

Um comentário: